Meus amigos de caminhada saíram mais cedo, eu não
podia perder a oportunidade de um último papinho com Jato. Fui tomar café da
manhã no albergue, ganhei um cajado onde Jato escreveu: “Laila, que tudo
seja Luz”, me despedi do Carlos (hospitaleiro) que me presenteou com uma
pulseira do albergue (ainda hoje no meu braço) e saí, com o coração apertado e
desejando ficar! Fabrício ainda ficou por lá, sairia um pouco mais tarde!
Na saída de Villafranca tinha 2 opções a escolher:
Ou seguir pela carreteira ou pelas montanhas, para esta última opção uma placa
avisava que era uma rota somente para peregrinos bem preparados! Eu via os
peregrinos pararem em frente à placa e seguirem pela carreteira, mas como
sentia–me a “super peregrina” resolvi seguir pelas montanhas (não sei por que,
mas sentia uma atração em andar nas montanhas). Estava frio, mas o tempo estava
aberto e eu comecei a subida (e que subida) sozinha, sem avistar ninguém a
frente ou atrás.
Meus pensamentos jorravam, eu andava cantarolando algo que até
agora não sei o que era, a neblina começou a descer e eu resolvi parar um pouco
para esperar alguém passar. Quem sabe Fabrício apareceria, pois eu sabia que
ele havia saído depois de mim. A visibilidade era péssima e nem sinal de
peregrinos por perto. Tirei a mochila, encostei o cajado em uma árvore e sentei
no chão!
Neste momento senti a presença de meu avô, não sei como explicar, mas
ele estava comigo. Foi quando numa espécie de transe imagens da minha vida
começaram a surgir como slides… era minha infância, adolescência, meu
casamento, meus filhos, minha vida estava sendo apresentada como se eu fosse
uma simples espectadora, sentimentos de tristeza e alegria se fundiam, uma
ponta de medo apareceu, mas eu sentia que não estava só!
A neblina estava densa e a sensação era de estar no
céu! Não sei quanto tempo permaneci naquela posição, imóvel, até que num
impulso repentino comecei a pegar pedras e escrever o nome de meu avô, como se
estivesse agradecendo por algo que ainda não estava muito claro para mim.
A solidão estava me fazendo bem!
Coloquei a mochila, peguei meu cajado e segui, sem
enxergar muito bem, e pela primeira vez senti muita vontade de fazer xixi e
certamente não teria nenhum banheiro por perto… Não pensei duas vezes, as
montanhas eram minhas amigas e não diriam nada! Eu estava só! Verdadeiramente
só!
Demorei bastante tempo para atravessar aquela etapa
e ninguém apareceu!
Cheguei a Vega de Valcarce onde sabia ter um
albergue Brasileiro! Queria entrar, conversar… Vi a bandeira brasileira e um
senhor italiano que andava a alguns metros atrás de mim gritou: “Brasil!!!” eu
acenei para ele e entrei! A hospitaleira veio em minha direção e eu disse:
“Olá, sou brasileira e queria um carimbo na minha credencial”, ela apontou para
uma mesinha perto da porta e disse: “Está ali” virou as costas e saiu. Caraca
que tratamento! Decepcionada com o tratamento da brasileira carimbei minha
credencial e parti para enfrentar a subida do Cebreiro!
Foi a etapa mais difícil para mim, ainda mais
difícil que os Pirineus! O frio era muito grande, a subida muito acentuada e a
neblina não me permitia ver nada! Eu parava de vez em quando, apoiava em meu
cajado (santo cajado) e pensava: “Eu, a super peregrina não vou conseguir
chegar ao Cebreiro”. Mas consegui, cheguei por volta das 17 horas e todos meus
amigos já estavam por lá, inclusive o Fabrício!
Depois que tomei um bom banho quente fui com
Fabrício e os alemães ao bar para beber algo e depois jantar! Que frio era
aquele! Fabrício acostumado ao calor de Salvador quase caiu duro e eu tremia
sem parar!
No jantar comemos polvo (bem gostoso)!
Que dia
duro! Percebi que o final do caminho estava próximo e me senti estranha com
isso… engraçado, mas esta mesma sensação estranha, de um grande vazio volta
agora que estou chegando ao final dos meus relatos! Receber o apoio e os
comentários carinhosos de amigos e de pessoas que nem conheço tem sido muito
bom… Não queria que acabasse!!!
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